A vez do conto
Venho desenvolvendo em escolas e em Feiras do Livro, palestras
e oficinas dentro de um projeto que intitulei “A vez do conto”. Criei este
projeto por uma razão especial – a tentativa de resgatar o prazer da leitura
entre um público que vem apresentando, cada vez com maior incidência, postura
negativa frente ao ato de ler. Pior que este público é constituído por
professores e estudantes, justo aqueles que mais deveriam ter contato
permanente com o livro, o jornal, a revista, o texto informativo e literário.
Nas ocasiões em que lanço entre o alunado a pergunta:
Quem de vocês gosta de ler?, a resposta pronta e sincera é, para a maioria, um
“eu não!” bem sonoro. Com sorte, um que outro aluno levanta o braço para
declarar que “sim, eu gosto de ler”, me convencendo de que nem tudo está
perdido. Não só os estudantes – pequenos ou grandinhos –; de maneira análoga, professores
não se constrangem em confessar que leem pouco, por falta de tempo ou mesmo por
falta de interesse. Desejo conhecer os motivos da rejeição à leitura de parte
dos alunos, e eles apresentam respostas nada tímidas: “ler é muito chato” ou “ ler
toma muito tempo”.
De há muito, tais respostas não me surpreendem. Antes me levam
à busca de entendimento do que, afinal, está se vivendo na atualidade – uma
sociedade apressada, movimentando-se mediante tarefas pré-estabelecidas em
números e prazos, num espaço informatizado, contatos online, informação
televisiva, apelo incessante ao sujeito pela linha do visual e do auditivo, em
marteladas céleres e intermitentes. O tempo é escasso para todos. Pais e filhos,
ao retornarem para casa após estudo ou trabalho, se isolam em seus facebooks,
ou nas urgências de respostas a emails. Nestes, até as palavras sofrem
limitações; já não veem por extenso, para isso existem as abreviaturas caóticas
e os símbolos convencionados à revelia. Não há tempo a perder, nem com
conversas nem com leituras, ainda mais se essas forem extensas ou distantes do
interesse imediato. Por isso o texto é “chato” e “toma tempo demasiado”. Com essa
arquitetura de sistema, a rejeição à leitura é consequência perfeitamente
admissível. Não há como discordar.
Artigos de jornais e revistas fazem referência à
expressão: SLOW READING – leitura lenta. O que isso quer dizer? Que é possível
e maravilhoso estabelecer uma experiência profunda com um texto longo – um
livro, um artigo, um ensaio, uma novela – através de uma leitura lenta, onde
irá ocorrer um entrosamento de ideias entre leitor e autor do texto em questão, proporcionando
experiência pessoal de enorme riqueza. Mas como chegar a este nível,
acostumados que estamos com textos curtos e leituras mínimas na Internet que
nos tornam leitores menos atentos e menos capazes de interagir ou se emocionar?
Sugerir que o jovem se afaste do computador é medida utópica, além de ser um
despropósito. Então o quê?
Conquistar o aluno para a leitura fluente, crítica e
prazerosa constitui processo longo. “A vez do conto”, projeto que cito acima,
busca uma alternativa menos radical e acredito, mais eficaz, pois que se propõe
a caminhar paralelo com a pressa e o imediatismo atual. Elege, como via de
aquecimento, leitura continuada do gênero conto como o texto da vez. O conto, e não ainda o
livro ou o texto longo, constitui unidade literária
por excelência, uma vez que envolve uma narrativa com começo, meio e fim, e oferece a vantagem
de uma narrativa curta, sem desvios do foco principal, concisa e de
desenvolvimento mais instigante, mais limpo e ágil do que uma narrativa longa.
A leitura de um conto despende menor tempo e assegura maior envolvimento do
leitor não habituado a ler; além de estar em melhores condições de concorrência
com os demais meios apontados.
A
leitura de contos e de mini contos pode ser a etapa que prepara para a leitura
de maior porte, aquela em que apenas um pequeno percentual da população se
dedica com disciplina. Aprender a gostar e desenvolver a prática de ler,
através da leitura de contos – e também de mini contos e micro contos – pode
significar um ganho em termos de aquisição do hábito e da formação de futuros
leitores.
SLOW
READING – Pare. E agora leia devagar. E aproveite tudo que a leitura pode
oferecer.
Jacira Fagundes
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