Jacira Fagundes
Estive, no período de férias na praia, ocupando minhas horas vagas entre um prazer e um dever, com leituras de diferentes estilos de obras. Costumo fazer isto todo ano e geralmente me sobra algum espaço para, além destas, refazer algumas leituras antigas. Desta vez foi o caso de um livro já lido, mas sempre bem vindo como leitura voltada a comportamento.
Não façam críticas apressadas. Eu não o classificaria como livro de auto-ajuda, embora não menospreze tal literatura. Crer para ver, de autoria de Wayne W. Dyer é um guia de análise do comportamento. Conforme afirmações do autor, são os nossos pensamentos que nos levam a agir de diferentes formas, muitas delas amargas e infelizes. Não são os fatos externos, ou as circunstâncias, na maioria das vezes, os responsáveis por nossos caminhos prazerosos ou intrincados, amorosos ou cruéis, ternos ou vingativos. E, contrariando o dito atribuído a São Tomé – que é preciso ver para crer – Dyer faz um demonstrativo do processo ao inverso – vemos somente aquilo em que anteriormente acreditamos em nosso pensamento.
É de se refletir sobre a questão. Tomemos o conhecimento do caso recente para os brasileiros, da personagem que nos chega através do candidato a Oscar – “Preciosa”. Ela saiu da vida real para a telona, é inculta, pobre, negra, gorda e feia. Qualidades deploráveis para muitos, sem dúvida. Conta-nos no livro autobiográfico que antecede ao filme que foi abusada pelo pai e (pasmem!) também pela mãe. Teve dois filhos frutos da relação incestuosa. Caberia ser uma vida perdida, sem esperanças de futuro. Mas, provavelmente, deve ter acontecido algo precioso em sua mente – um pensamente aberto a oportunidades, que cresceu e acreditou, e crendo, encontrou a ajuda que precisava para seguir vivendo, daqui pra frente com a dignidade merecida.
Diz-se que, quando o discípulo está pronto, o mestre aparece. Discípulo pronto, creio, nada mais é do que aquele que construiu na mente o arcabouço para receber o conhecimento. Assim mais aprende o aluno do que o mestre ensina, sabemos disso.
A ciência, os grandes inventos, as vacinas, a tecnologia, trilham este processo da crença num pensamento que se instala e é perseguido com trabalho e empenho por mentes fabulosas que, muitas vezes na contramão do factual e do já estabelecido, leva a resultados edificantes para a humanidade. A história do homem, desde os primórdios da civilização, nos comprova.
O mundo é pleno de oportunidades e de possibilidades e, no entanto, hoje nos parece ver a raça humana presa numa armadilha que ela própria construiu segundo circunstâncias nefastas. “Por que não?” talvez seja a pergunta chave que se deva fazer diante destas possibilidades. Se o pensamente de sermos mais fraternos, ou mais inteligentes, ou mais audaciosos, ou ainda responsáveis, comprometidos, talentosos; ou se precisamos fazer uso da rebeldia, da coragem, do desenlace, para sairmos do caos e enxergar a luz, que se abrace tal questionamento. Crendo, que se persiga. Para poder visualizar e alcançar outra realidade mais de acordo com a felicidade e valores éticos, principalmente.
Possamos, cada um de nós – enquanto seres humanos ainda não enfraquecidos –, cumprir nossa parte, direcionando e acreditando no poder construtivo e salvador de nossas idéias.
Crônica escrita em 03 de março de 2010 e publicada no jornal cultural RSletras de março/2010
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