Vem aí a Páscoa!

Coelhinho da Páscoa! Que trazes pra mim?


 

Coelhinho da Páscoa, que trazes pra mim...

                                                                      

                                                                                               

 

                                      Aproxima-se outro domingo de Páscoa. E as pegadas do                                                    coelhinho em direção ao esconderijo, são cada vez menos                                                  visíveis.

 

           

            Às crianças, já não interessa a quantidade de coelhos e ovinhos de chocolate que encontram nos ninhos no domingo de Páscoa – um ovo, dois ovos, três ovos, assim...

            Sequer a cor viva, brilhante, os coloridos intensos – azuis, amarelos e vermelhos também...

            Menos ainda a canção que embalou dias e noites de espera, só aliviada no momento do encontro com o ninho que  coelhinhos diligentes se incumbiram de encher na véspera, durante a calada da noite – Coelhinho da Páscoa, que trazes pra mim...

            Somente depois de intensa busca, acompanhando ou não as tênues pegadas do coelho, é que curiosidade, surpresa e fantasia se misturavam à realidade. E então o ninho era ostentado com alegria, e tudo dava lugar ao encantamento.

            Porém, as crianças de hoje, perderam este encantamento, o que, sem dúvida, é de se lastimar.

            Entre as preferências dos pequenos estão, em primeiro lugar, as marcas do chocolate, as que são charmosas e disputadas através da mídia.  Interessa , mais do que a diversidade e tamanhos dos ovos, os brinquedinhos escondidos em seu interior – pecinhas de montagem de algo desajeitado e ordinário, geralmente abandonadas devido à dificuldade de encaixe. Ou ainda por desinteresse momentâneo.

            Para garantir que vocês – pais, padrinhos, tios e avós – façam a coisa certa, quer dizer, acertem nas marcas e nos pesos e ainda atentem com absoluta garantia, na observância do brinquedo surpresa que deverá constar no interior dos ovos, elas se fazem presentes em hora e local, substituindo os já não tão confiáveis coelhinhos da canção. Como investidores exigentes, conferem procedência, prazo de validade, vulnerabilidade de embalagens e decidem sobre a compra.

            A vocês – representantes financeiros dos coelhos – cabe o pagamento no caixa. Papai e Mamãe, por receio de desacertos  frente a seus pequenos, costumam concordar e sentirem-se mais seguros com a aquiescência dos filhotes.

            A surpresa, a busca, a curiosidade infantil e a fantasia que até aqui permearam as manhãs do domingo de Páscoa, que rumo tomaram? Provavelmente o rumo da indiferença. Porque a busca foi antecipada: aconteceu ali no supermercado, entre as muitas opções de peixes para a sexta-feira santa e de carnes para o churrasco de domingo; e o pouco de encantamento adquirido durante a transação ficou esquecido no carrinho, depois do caixa.

            Ouso acreditar que talvez o afastamento destes e de tantos outros singelos rituais esteja concorrendo para que muitos dos jovens e adolescentes de hoje, por solidão ou desencanto, tenham desistido, tão precocemente, da caça aos legítimos “Ninhos de Páscoa” recheados de sabores verdadeiros. E se joguem – vítimas inocentes – na busca de ninhos nefastos e infelizes, repletos de “ovinhos” cujo recheio não passam de  brinquedinhos mortíferos e mal encaixados.

                                            

                                                                                                    Jacira Fagundes

                                                                                                                   Escritora

2 comentários:

  1. Ótima reflexão sobre o abandono dos rituais inocentes de outrora e as consequências de tal morte dos atos meigos.

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  2. Excelente texto!! Mudaram os tempos e mudaram as atividades da época de Páscoa. O ovinho com brinquedo dentro é um exemplo. Antes do chocolate terminar já está quebrado. Que pena!!!

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